Diz-nos José Augusto Cardoso Bernardes que Moralidade é
Género marcante do teatro medieval francês, caraterizado pela intenção didática, pela destrinça rigorosa entre o Bem e o Mal e pela representação alegórica. Mas longas que as farsas e gozando de menor favor do público, as moralidades constituíam, na Europa de Quinhentos (assinalada por grandes querelas teológicas) uma via privilegiada de catequese. Existem pelo menos dois tipos de m.: a m. Alegórica e doutrinal, que se define pela densidade da mensagem e pela exclusividade da alegoria e a m. Políticosocial, que envolve personagens verosímeis, subordinadas, por vezes, a uma disposição narrativa. Gil Vicente cultivou essencialmente o segundo tipo (Feira, Barcas, Sibila Cassandra, etc), sendo Alma o único exemplo da moralidade doutrinal. Na sua globalidade, o teatro vicentino pode ser identificado com uma espécie de moralidade transversal, na medida em que nele se observa uma evidente intenção doutrinal e didática e uma delimitação entre o que deve ser louvado e o que deve ser repreendido.
“Abecedário” in Gil Vicente, pp.218-219 (Edições 70, 2008)